segunda-feira, 14 de julho de 2014

Chegando em ponto – vida e vida de André Monteiro

Meninos, uma crítica orgânica de André Monteiro não seria aquela que trataria de uma relação entre vida e obra. Uma crítica orgânica de André Monteiro, que aqui está para além de um nome, seria aquela que trataria de uma relação entre vida e vida. Uma crítica de André Monteiro não ofenderia André Monteiro se por acaso o mandasse tomar no cu. Uma crítica de André Monteiro enrabaria André Monteiro e daí nasceria um filho monstruoso. André Monteiro adoraria ser enrabado. Ele não se prende a esses moralismos babacas, tampouco tem paciência para lidar com os afetos que impedem a ventilação do ambiente. André Monteiro e André Monteiro. Vida e vida. Uma inscrição dupla. Uma indistinção. Um devir. Um acontecimento. Um encontro entre a vida de André Monteiro e a vida de André Monteiro estaria no interior de uma política, de uma ação que supera as cartilhas partidárias, ou de uma ética, acionada e já incorporada à palavra est-ética. Aquele que diz que ainda é tempo de matar-se, mas passamos do tempo de cometer tal filhadaputice. Aquele cujo encontro entre vida e vida diz que já seria lugar comum romper-se aos vinte e sete, mas também aos cinquenta, aos trinta, aos quinze. Aquele que diz que morremos a conta gotas, sempre um pouco, pois nascemos no mesmo dia em que a morte se nos inscreve. O suicídio, disse-me uma vez um desses a quem chamo André, é um excesso de vida, uma força insuportável e incapaz de se conter em um corpo, aquilo que tomou uma proporção em função da qual não se consegue, numa encruzilhada, dar o passo em direção à manutenção da vida. Um desses a quem chamo André não é daqueles que vai ao túmulo de Jim Morrison lamber seus ossos, tampouco faz do vômito de Hendrix um troféu a ser exibido como fetiche marginal setentista. Um desses a quem chamo André prefere comê-los e saciar-se com os delírios musicais de quem deixa-se arrastar pelo beat até os limites da esquina, até optar pelas ruelas inesperadas, pelos poros inimagináveis da linguagem. Comendo, Andrés vão se formando e se formando e se formando... Zoando as palavras e com as palavras, esses muitos Andrés vão criando, do ócio e do ácido, suas potências lúdicas, vigorosas e alegres. Meninos, eu vi. Meninos, eu vejo. Uma crítica de André Monteiro não se rebaixaria frente ao outro, mas roubaria momentaneamente suas forças vitais não para matá-lo, mas para viver juntos. Já uma crítica a André Monteiro, no entanto, diria que nós também saímos vitoriosos de toda essa loucura. Uma crítica a André Monteiro jamais poderia rebocá-lo. Uma crítica a André Monteiro só seria uma crítica se assumisse de antemão a impossibilidade de apreendê-lo. Uma crítica a André Monteiro jamais seria uma crítica a André Monteiro, mas uma crítica junto com André Monteiro, como aquele que surfa e aquele que resgata o surfista. Criticar André Monteiro é antes de tudo amá-lo. Criticá-lo é ser contra os universitários predadores. Contra o ressentimento das criações amorfas. Contra o mofo dos salões caducos da academia. Contra todos os filhos da puta. Meninos, a vida e a vida estão passando... André e André. Quem não for capaz de escapar pelas brechas jamais poderá abraçá-los. 

Edmon Neto
(Poeta e doutorando em literatura pela UFJF) 

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